quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Descendo aos porões


Sílvio Lanna
O Presidente da República promete mandar para o Congresso Nacional nos próximos meses um projeto de lei criando a Comissão Nacional de Verdade sobre a tortura no período da ditadura militar. Pretende esclarecer fatos, apurar e punir responsáveis e, por consequência, abrir a possibilidade de reparação civil pelo Estado.
A polêmica sobre o tema é grande e tudo leva a crer que os debates vão ser acirrados.
Os opositores dirão que todas as questões envolvendo o período ditatorial já foram resolvidas e soterradas pela Lei da Anistia e que o revolvimento do tema contém flagrante inconstitucionalidade.
Certamente o Supremo Tribunal Federal será provocado a decidir sobre isto, estabelecendo se há fronteiras ou não entre as duas normas legais.
Já os defensores da medida dirão que atos de tortura não são crimes políticos, estando, portanto, desabrigados pela anistia. Afirmarão ainda que é crime imprescritível no Brasil e, ainda, considerado como agressão contra a humanidade pelo Direito Internacional.
O debate será extremamente saudável para a sociedade brasileira que está acostumada a conviver com a dicotomia teoria-prática em questões polêmicas. Assim é com o preconceito racial, que teimamos em náo reconhecer no cotidiano, com o aborto, cuja prática fingimos não perceber e com a tortura, naturalmente praticada nas prisões, a que fechamos os olhos.
Fato incontestável é que os agentes da ditadura militar praticaram violência contra presos politícos já dominados e presos, utilizando-se de requintes de crueldade. Diversos casos denunciados e relatados pela ONG Tortura Nunca Mais trouxeram à luz casos apavorantes de violência contra homens e mulheres, demonstrando que os atos eram praticados com requintes de sadismo que remontam à Santa Inquisição.
É necessário que a sociedade brasileira adote uma posição firme em relação à tortura, não mais fingindo sua inexistência no passado e no presente. Nossa indolência é fator preponderante para sua manutenção ativa e também para que os arautos da ditadura possam promover sua publicidade, como foi o caso do jornal Folha de S. Paulo, que em sua edição de 19.02.09 retratou-a como "ditabranda", em uma tentativa de sua reabilitação social.
Tortura é crime hediondo e torturador é criminoso que não merece regalias. Seu lugar é na cadeia, sem os benefícios que a lei concede a atos infracionais de menor lesividade.
Nos porões da ditadura militar brasileira ainda há muito o que descobrirmos, inclusive criminosos que não merecem o perdão concedido pela Lei de Anistia.

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