sexta-feira, 18 de maio de 2012

Há ossos debaixo do tapete...


A recém e corajosamente instalada Comissão da Verdade tem uma nobre tarefa: a de retirar os ossos que jazem sobre o tapete da democracia brasileira. Desde os terríveis anos da ditadura tentamos acreditar que amanhã vai ser outro dia, mas nada poderá mudar realmente se não passarmos a limpo alguns fatos que nos espreitam escondidos.

É muito simples dizermos que a anistia foi concedida em duas mãos e que os pecados cometidos de um lado apenas implicaram nos erros do outro. Não, não foi assim.    

De um lado havia uma turma de idealistas desestruturados, mal armados e inconsequentes consigo mesmos. Tencionavam impedir a saída do país dos trilhos da constitucionalidade, mas avançavam temerariamente no confronto com um inimigo muito superior.

Do outro o próprio Estado tomado de assalto por um golpe teoricamente amparado no medo do bicho papão, mas que em verdade objetivava reconduzir ao poder a mesma oligarquia que sempre dominou o Brasil. Pura hipocrisia tentando esconder um painel em que a minoria de sempre mais uma vez julgou-se no direito de comandar a maioria de sempre.

É certo que os revolucionários mataram, agrediram, assaltaram, feriram, afrontaram e agitaram. Mas os golpistas fizeram muito mais, antes e depois da reação. Eles espezinharam a democracia, vomitaram o AI-5, torturaram barbaramente, assassinaram em seu porões, consumiram corpos, enfim, não foram páreo para seus opositores...

Basta conhecermos alguns detalhes macabros dessa história transmitidos por vários órgãos de imprensa. 

Muitos dos inimigos do regime foram decapitados, esquartejados e enterrados em covas junto ao lixo de bases militares. Alguns, como Mário Alves, tiveram o corpo esfolado por escova de arame, além de serem agredidos com cacetetes farpados. Ainda houve casos como o de Stuart Angel, que após ter sido barbaramente torturado foi amarrado com a boca no cano de descarga de um veículo militar e arrastado dentro de uma base militar. Isto é só uma amostra de tantas atrocidades cometidas pela ditadura brasileira.

Não houve igualdade, os crimes oficiais ocorreram em maior número e com requintes de crueldade que produziram 144 brasileiros desaparecidos, dos quais não se tem notícia do paradeiro de seus corpos. 

Daí a Comissão recém instalada chamar-se "da Verdade", pois é ela que precisa ser restabelecida. Se os fatos daí derivados vão ser objeto de apreciação judicial ou não, é questão que cabe ao Poder Judiciário, que é poder e só existe hoje graças à redemocratização do pais.

E ainda, se os clubes militares ou quaisquer outras instituições desejarem criar suas próprias comissões, que o façam. Se há ossos também do outro lado do tapete que sejam eles mostrados à sociedade. 

A verdade precisa vir à tona, o tapete precisa ser sacudido e o travo advindo das mágoas do passado precisa ser curado, para que amanhã possa mesmo ser outro dia. 

Um comentário:

  1. Maria de Lourdes Furtado de Oliveira24 de maio de 2012 às 20:00

    Excelente texto, muito bem escrito e bem elaborado que esclarece muita coisa àqueles que ainda desconhecem grande parte do que realmente aconteceu na época da Ditadura.

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